quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Super 8

Acho que Steven Spielberg resolveu produzir Super 8 porque deve ter pensado “Ei, roubaram esse filme da minha cabeça, meu nome tem que entrar pelo menos nos créditos”, ou então ele chamou J.J. Abrams, criador de Lost, que estava em alta, e pediu que fizesse para ele “um filme aí que era pra eu ter feito há anos, mas deixei de lado porque E.T. era melhor”. São suposições bobas, mas o filme claramente tem uma atmosfera idêntica à de E.T. e Contatos Imediatos do Terceiro Grau, e não apenas pelo recorrente tema de extraterrestres, mas também pelos seus personagens, pelo clima de cidadezinha americana, a trama de mistério e até pela trilha heróica típica do Spielberg.

O filme se passa em 1977 e logo me ganhou apenas por falar de garotos tentando fazer um filme de zumbi com uma câmera Super 8, muito usada na época. São típicos nerds normais, lembram muito os antigos jovens fascinados por zumbis e ficção científica, que se comunicavam por walkie talkies, faziam fanzines e rádios amadores e sonhavam em presenciar atividade alienígena.

Pois bem, estão eles filmando uma cena perto do trilho de um trem quando acontece um suposto acidente, um trem bate de frente com uma camionete e descarrila gerando muitas explosões e gritos histéricos, tudo sendo filmado pela câmera amadora dos meninos. Começa então a correria para saber o motivo do acidente, o que estava naquele trem e porque várias pessoas estão misteriosamente desaparecendo na cidade. O mistério então passa a tomar conta da trama, como em Lost. E como em muitos filmes do Spielberg, só as crianças estarão no lugar certo onde as coisas certas irão acontecer, logo elas é que vão desvendar o mistério.

Há um destaque para a relação familiar do protagonista, o pequeno Joe Lamb, que acabou de perder a mãe, com o seu pai, Jackson Lamb. Ambos ainda sofrem a dor da perda e têm de lidar com os acontecimentos mesmo não se entendendo um com o outro.

OK, temos as mesmas fórmulas de sempre, um garoto apaixonado por uma garota, um policial decidido a descobrir o que diabos (what a hell) está acontecendo, figurantes aparecendo no filme apenas para morrer, pessoas sendo atacadas por um monstro que precisa ser detido e um grupo (as crianças) agindo em surdina em meio ao burburinho de helicópteros e pessoas desesperadas. Mas o filme trabalha bem esses clichês e nos faz ficar ansiosos para saber como tudo vai se desenrolar. Mesmo que a gente deduza o ponto final, a história está cheia de vírgulas que são quase como curvas em alta velocidade e em momento algum ficamos entediados. Assim dá pra aceitar tranquilamente algumas cenas batidas, como a clássica cena na qual o garoto (o mocinho) é o único que tem a brilhante ideia de tentar conversar com o monstro pra ver se ele se toca e deixa todo mundo em paz. Tudo bem, deixa passar.

O filme tem uma boa caracterização do período histórico, tem até uma cena em que a população da cidade culpa os soviéticos pelos sumiços que andam acontecendo. Tem também uma ótima construção dos personagens (pelo menos das crianças), cada um deles parece ter seu peso ideal na história e mesmo que um seja mais apagado que o outro, eles acabam tendo uma ótima harmonia juntos. Tem o herói, gentil, ingênuo e predestinado; tem o seu melhor amigo gordo metido a corajoso; o falastrão bobo (especialista em bombas); a mocinha bonita e destemida; tem um garoto de óculos que seria o inteligente se tivesse mais espaço na trama e tem até um último garoto que é quase figurante e serve bem para alguns comentários do tipo “corram!” ou “eu não vou, nós vamos morrer”. O personagem do gordinho, Charles, lembra Steven Spielberg, que tinha três irmãs e começou a fazer seus primeiros filmes com uma super 8, usando suas irmãs e seus amigos nos experimentos. Logo não tinha como a qualidade do filme não fazer jus a tudo que ele representa.

Gladson Caldas

sábado, 13 de agosto de 2011

A Árvore da Vida

Não acredito que uma obra de arte precise ser hermética para ter qualidade. Acredito que é possível um artista passar a mensagem pretendida de maneira simples. Se não fosse assim, não falaríamos até hoje de Manuel Bandeira ou Beatles. Dizer as coisas mais complexas de maneira simples é um dom talvez mais especial do que sobrepor camadas e camadas de uma poesia distante da maioria dos leitores.

A Árvore da Vida, de Terrence Malick enquadra-se no segundo tipo: um filme muito bonito, muito poético, muito longo e muito difícil. Treze anos depois de realizar Além da Linha Vermelha, o diretor mantém o mesmo tom. A ação fica em segundo plano, o que importa são as sensações, os questionamentos dos personagens a respeito da vida, de Deus, do amor e de tantos outros universalismos que a maioria de nós prefere deixar pra lá, porque a vida prática já é muito cansativa.

A tênue linha narrativa concentra-se numa família, aparentemente dos anos 1950, que é abalada pela morte de um dos filhos. A partir desse evento é que começam os questionamentos citados acima. E o diretor vai buscar a resposta através da história do universo, começando pelo Big Bang. A morte de uma criança e o decorrente sofrimento dos pais e dos irmãos são insignificantes em relação ao tamanho do Universo. Deus se perde naquela imensidão e por isso ele não dará resposta para aquela mãe (Jessica Chastain) que chora a perda do filho. Não há por quê. É assim, é ao acaso.

A outra ponta da narrativa converge para o filho mais velho do casal (Hunter McCracken/Sean Penn), já adulto e aparentemente atormentado. E daí a história volta até o seu nascimento, em seguida o nascimento dos irmãos. Revela-se então o egocentrismo do personagem, o confronto com o pai autoritário (Brad Pitt), a segurança nos braços da mãe carinhosa e as consequências que isso acarreta. Emblemática é a frase do garoto numa conversa com o pai: “Vocês lutam dentro de mim”.

Decidir assistir a esse filme não é o bastante. Algumas pessoas saíram da sala antes dos quinze minutos de projeção. Ao final muitos em silêncio ou supondo teorias a respeito do tema do filme. Alguns tentavam definir o que era a tal “árvore da vida”. Mas não é bem assim. Há as obras que se deve entender, há as que se deve sentir. A Árvore da Vida definitivamente é daquelas que remetem a sensações, não a conclusões racionais. É daqueles filmes que servem como exemplo de filme de arte — afinal não se ganha a Palma de Ouro em Cannes à toa — mas peca por deixar de fora o leitor comum. Parodiando o referido Manuel Bandeira, “sou espectador menor, perdoai”.

Filipe Teixeira