domingo, 26 de junho de 2011

Potiche: Esposa Troféu

Em Potiche: Esposa Troféu, de François Ozon (baseado em peça teatral de Pierre Barillet e Jean-Pierre Grédy), Catherine Deneuve vive a dondoca Suzanne Pujol, esposa do empresário Robert Pujol (Fabrice Luchini). Sua vida resume-se a cuidar da casa e a compor versos bucólicos enquanto seu marido trabalha e a trai com outras mulheres. Mas, como estamos na França dos anos 1970, não há melhor época ou local para que haja uma revolução na vida de Suzanne.

Tudo começa quando Robert é sequestrado pelos empregados de sua fábrica de guarda-chuvas, que estão em greve. Para acalmar os grevistas, Suzanne apela para o deputado-prefeito Maurice Babin (Gérard Depardieu), com quem teve um affaire quando eram jovens e cuja administração tem forte inclinação à esquerda.

Ao saber que sua vida foi salva por um comunista, Robert tem um infarto. Agora é preciso que alguém tome conta dos negócios, mas os filhos Laurent (Jérémie Renier) e Joëlle (Judith Godrèch) recusam essa tarefa, então cabe a Suzanne assumir o posto, notícia que é recebida com risos debochados dos filhos e até da secretária-amante do marido.

Mas Suzanne – relembrando a administração de seu pai, fundador da fábrica, que serviu como dote para o casamento – concilia os interesses dos empregados aos da própria empresa. Ao mesmo tempo, ela é a mãe que apoia os filhos, que passam por momentos difíceis: Laurent namora uma garota sem a aprovação do pai (pois supõe que ela seja fruto de uma de suas puladas de cerca), além de não saber ainda o que quer para sua vida profissional, já Joëlle tem planos de se separar de Jean-Charles, seu marido, que passa muito tempo viajando.

Em determinada cena, Joëlle diz que a mãe representa apenas um troféu para o pai, que ela não tem voz e que jamais aceitaria a condição secundária a que a mãe se submete. Mas Suzanne contraria as expectativas e se apresenta como símbolo do feminismo – tão em voga na época em que se passa a história –, ao qual Joëlle renuncia ao aceitar a chantagem do pai, que promete empregar Jean-Charles se ela ajudá-lo a retomar o cargo de diretor da empresa. Tendo perdido o controle da fábrica, Suzanne decide candidatar-se à deputada nas eleições seguintes.

Algumas pontas ficam um tanto soltas ao longo da trama, como a aparente homossexualidade de Laurent, o porquê da indiferença com que Suzanne trata uma eleitora na rua ou a ênfase que se dá à carona que Suzanne pega com um caminhoneiro (Sergi López) ao som de “Cucurrucucu Paloma”, de Tomás Mendez. Além disso, outro ponto negativo é a atuação de Judith Godrèch, que se perde no meio de tantos atores talentosos, principalmente os mais experientes.

Em contrapartida a esses mínimos defeitos, o figurino, assinado por Pascaline Chavanne, e a fotografia (sem crédito) são belíssimos e, embora trate de temas como o comunismo e o feminismo, em nenhum momento a obra soa panfletária. Temos, portanto, uma comédia agradabilíssima cujos pontos fracos são perfeitamente perdoáveis.

Filipe Teixeira

sábado, 25 de junho de 2011

Uma Doce Mentira


A comédia romântica Uma Doce Mentira, de Pierre Salvadori, conta a história de Emilie (Audrey Tautou), uma cabeleireira (e empresária) que, ao tentar arrumar a vida amorosa de sua mãe, envolve-se numa divertida confusão conduzida por ótimos atores.

Jean (Sami Bouajila) é o zelador do salão de beleza de Emilie e alimenta uma paixão platônica por ela. Um dia ele toma coragem, escreve uma carta de amor anônima e a envia para Emilie. Mas ela simplesmente joga a carta no lixo, sob o olhar atento e decepcionado de Jean.

Depois de encontrar-se com sua mãe, Maddy (Nathalie Baye), que ainda não superou o divórcio e alimenta certo sentimento pelo ex-marido, Emilie decide enviar-lhe a carta anônima para animá-la. O problema é que Maddy se apaixona pelo homem misterioso e o que antes era tristeza pela saudade do marido, torna-se uma angústia devido à espera de uma nova carta de seu admirador secreto.

A situação de Emilie se complica quando Maddy vê Jean colocando uma carta na sua caixa de correio. A carta, de teor altamente erótico, foi na verdade escrita por Emilie, no intuito de manter sua mentira. Maddy segue Jean até o cabeleireiro (destaque aqui para a bela fotografia de Gilles Henry) e então Emilie tem de confessar todo seu plano a Jean, pedindo inclusive que ele marque um encontro romântico com sua mãe.

Ao longo do filme, a personalidade egocêntrica de Emilie é dissecada e exposta ao espectador, pois, embora tente ajudar a mãe, percebemos que o fim dessa atitude é na verdade sua própria paz. Mas o que poderia dar um tom pesado à trama é sobrepujado pelas situações hilárias em que os personagens se envolvem. Destaque para Stéphanie Lagarde, que representa a personagem Sylvia e apenas com o olhar constrói cenas engraçadíssimas.

São muitos os desencontros dos personagens e em muitos momentos as mentiras de Emilie e Jean estão prestes a ser desmascaradas, mas o roteiro competente assinado por Benoît Graffin e pelo próprio diretor conduz a história de maneira que se torna plausível e em nenhum momento maçante, pois souberam dosar o drama, a comédia e o romance na mesma história.

O final extremamente previsível, que em outros filmes seria um defeito, neste coroa uma bela produção, que se apresenta como uma comédia romântica simples e assim se cumpre, sem falta ou sobra.

Filipe Teixeira

domingo, 5 de junho de 2011

O Primeiro que Disse




Em O Primeiro que Disse, o diretor turco Ferzan Ozpetek disseca uma rica e tradicional família italiana. Três gerações convivem na mesma casa e cada um de seus membros tem seus segredos e suas vontades sufocadas pelos costumes tradicionais, que os impedem de viverem de maneira plena e feliz.

O personagem central da história é Tommaso (Riccardo Scamarcio), o filho que foi estudar Administração em Roma e que volta para tomar a frente da indústria da família, que fica em Lecce, sul da Itália. Mas ele confessa ao irmão, Antonio (Alessandro Preziosi) que na verdade estudou Letras, que quer ser escritor e que é gay. Ele decide contar para a família, mas, no momento em que pede a palavra no jantar para revelar tudo, Antonio toma a frente e confessa que é homossexual.

Vincenzo (Ennio Fantastichini), o pai, típico italiano machão e sangue quente, expulsa o filho de casa e na mesma noite tem um infarto. Todas as suas esperanças agora voltam-se para Tommaso, que esconde ainda mais seu segredo para não piorar o clima em casa e a saúde do pai.

A matriarca (Ilaria Occhini), avó de Tommaso, serve como ponto de equilíbrio de todas as emoções que os acontecimentos suscitam e é ela que toma a atitude, embora radical, necessária para que tudo volte ao normal. É a ela que Tommaso mais se assemelha, com suas atitudes ponderadas, mesmo que com o semblante sempre preocupado, pois não pode ser quem realmente é.

E para confundir ainda mais o protagonista, a estonteante Alba (Nicole Grimaudo) é quem o auxilia no comando da empresa. Ela está na maior parte do tempo em silêncio e, aos poucos, revela-se tão problemática quanto Tommaso. Não só ela, mas Luciana (Elena Sofia Ricci), tia dele, Elena (Bianca Nappi), irmã – e seu marido (Massimiliano Gallo) – também escondem segredos que ficam guardados para que não sejam motivo de fofocas na cidade.

Em muitos momentos, a comédia se sobressai, como quando os amigos romanos de Tommaso visitam sua casa em Lecce e precisam esconder da família do amigo, através de gestos e palavras, que são homossexuais. Mas essa leveza é quebrada pela presença de Marco (Carmine Recano), namorado do protagonista, que cobra dele uma atitude definitiva em relação à família e seu regresso a Roma.

Essa indecisão entre drama e comédia é o ponto fraco do filme, pois são bruscos os movimentos entre um gênero e outro. Ao final não sabemos ao certo se rimos ou se choramos com a história. Mas a mensagem-síntese do filme é muito clara e é passada pela avó de Tommaso ao final: “Continue cometendo seus erros. É assim que as pessoas felizes fazem”.

Filipe Teixeira