sábado, 30 de julho de 2011

Os Kennedys

A minissérie Os Kennedys, dirigida por Jon Cassar, apresentada pelos canais A&E e History no Brasil, quase não entrou no ar nos EUA, devido ao tratamento dado a alguns personagens, como John Kennedy (Greg Kinnear), que é retratado como um viciado em sexo, ou o patriarca Joe Kennedy (Tom Wilkinson), que em uma das cenas quebra um crucifixo. O próprio History Channel, que produziu a série e gastou nada menos que US$ 30 milhões, desistiu de exibi-la por considerar a produção dramática demais, fugindo do tom documental de seus programas.

Esse tipo de produção é sempre polêmica, principalmente quando se trata da república americana. Um exemplo claro é JFK – A Pergunta que Não Quer Calar, de Oliver Stone, filme que tenta desvendar os mistérios que ainda hoje rondam o assassinato de Jonh Kennedy (embora obviamente seja bobagem encarar os fatos narrados numa ficção como documentais). Aliás, Oliver Stone não se importa quando o assunto é “presidentes americanos”, pois em sua filmografia ainda constam Nixon, com Anthony Hopkins, e W., em que Josh Brolin interpreta o controverso George W. Bush. Vespeiros em potencial.

Traumas americanos à parte, a realização da minissérie Os Kennedys cumpriu o papel de um produto televisivo: entreter. Apesar da péssima dublagem (resta-nos esperar a versão em DVD para conferirmos o áudio original), a qualidade da produção foi impecável. Os atores, com ressalvas para Katie Holmes, trabalharam de forma espetacular, principalmente Tom Wilkinson. Outro que merece destaque é Barry Pepper, que interpretou Bobby Kennedy, principalmente na cena em que está prestes a ser assassinado. Os gestos do ator, bem como a direção de arte, a maquiagem e o figurino, mostram o quão detalhista foi a produção.

Muitos dos diálogos, principalmente os que se realizam na intimidade do clã, obviamente, não são reais, e é nesse ponto em que reside a crítica dos historiadores e dos puristas americanos. A maneira como eles foram construídos dão o tom das relações entre os membros da família Kennedy e a visão que cada um tem de assuntos quaisquer. Impressionante, por exemplo, é a frase que Joe Kennedy profere enquanto abraça Joe Jr. e John: “Esse país é nosso, é só pegar”.

Certas cenas também parecem existir apenas para montar o drama, como a que Joe Kennedy tenta levantar-se da cadeira de rodas no momento em que o repórter anuncia o assassinato de John; ou quando John pede desculpas a Jackie por fazê-la sofrer e ela responde: “Nem sempre foi fácil, e nunca foi maçante.”

Tudo em nome do entretenimento. A minissérie Os Kennedys é um marco da dramaturgia por contar uma história que todo mundo já sabe, mas por um viés mais humano a despeito de qualquer desvio dos acontecimentos reais. É assim que funciona. Quem quer ver uma história real que procure um documentário, e nem assim se pode garantir fidelidade aos fatos, pois toda obra está impregnada da ideologia do autor.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Meia Noite em Paris

Existe uma linha tênue entre um estilo peculiar e uma repetição chata. E Meia Noite em Paris empurra o seu diretor Woody Allen para o lado contemplado dessa divisão. Mais uma vez ele começou seu filme com vários planos gerais da cidade e um jazz tocando ao fundo, mas antes que eu considerasse isso mais do mesmo, percebi que a introdução se estendia além do normal, a sucessão de belas imagens de Paris não parava nunca, só teve fim depois que tocou a música inteira. Não era apenas uma mera apresentação do espaço onde a história ia acontecer, ele estava conduzindo o espectador a um deleite por Paris, por uma bela cidade ao som de uma bela música, ele queria que sentíssemos o que se sente ao chegar lá, uma grande inundação das belas artes em nossos sentidos. Pronto, estávamos dentro do universo do filme, a história pode começar.

E o filme inteiro foi isso, um passeio pelo mais alto escalão das artes, principalmente a literatura. Pois é a história de um escritor iniciante, Gil Pender, que visita Paris com a família da sua noiva e tenta se inspirar para escrever seu livro. A viagem não está sendo grande coisa, a noiva, a família e os amigos são um saco, mas ele está em Paris e alguma coisa tem que lhe inspirar. Então ele começa a fazer misteriosos passeios noturnos pela Paris que sempre quis conhecer, a Cidade Luz dos anos 1920, e passa a encontrar seus grandes ídolos da época: Scott Fitzgerald, Cole Porter, Ernest Hemingway, T.S. Eliot, Picasso, Salvador Dali, Luis Buñuel etc. e se apaixona por uma bela musa, Adriana.

Trata-se metaforicamente de um autor revisitando seus autores preferidos em busca de inspiração para escrever. Mas isso fica por minha conta. O escapismo é o grande tema do filme, o modo como idealizamos um lugar onde tudo é belo e canalizamos toda nossa vontade de conhecer este lugar e fugir da realidade. Este tema já foi abordado pelo diretor no filme A Rosa Púrpura do Cairo e num conto famoso dele chamado O caso Kegelmass, em que o protagonista é levado para dentro do romance Madame Bovary. O saudosismo é o sentimento que move o protagonista, que no início da história diz escrever um livro sobre um dono de uma loja que vende coisas retrôs.

Temos muitas características que encontramos em quase todos os filme de Woody Allen: o jazz na trilha, os lindos planos de paisagens com seus takes longos, uma fotografia meio dourada, adultério e o fato de seu protagonista ser um artista em crise de criatividade. Owen Wilson interpretou o personagem que anos atrás teria sido do próprio Allen, e ele conseguiu lembrar até mesmo muitos trejeitos do diretor, mas adquirindo uma personalidade própria, mesmo que seja a personalidade que ele faz em todos os filmes que participa.

O grande barato do filme é mesmo a caracterização das figuras históricas da literatura, fazendo ótimas piadas como a do Picasso ser temperamental, Hemingway, um cara durão e de apenas surrealistas entenderem quando Gil diz que é de outro mundo. Estava apreensivo sobre como o filme ia explicar as viagens no tempo. Qualquer explicação idiota estragaria tudo. Mas Woody Allen é Woody Allen, com uma curta cena ele nos deixou confortáveis em apenas pensar que as coisas aconteceram assim e pronto.

Gladson Caldas

sábado, 23 de julho de 2011

Assalto ao Banco Central

Vou aproveitar a resenha deste filme para falar de uma característica geral do cinema brasileiro, que é o movimento pendular de atores e diretores entre as novelas e a tela grande. Isso se dá principalmente através da Globo Filmes, que, nos últimos dez anos, encabeçou as grandes produções nacionais, pelo menos grandes em bilheteria. É comum vermos atores e diretores globais em produções cinematográficas e isso pode ter a ver com o fato de que estes atores atraem os telespectadores para as salas de cinema, além de tramas fáceis de serem digeridas. Grandes exemplos são Se Eu Fosse Você e A Mulher Invisível, este inclusive, migrou do cinema para a TV em forma de série. O caminho inverso foi percorrido pelo Casseta & Planeta Urgente, que rendeu dois longas.

Tudo isso é muito bom para o cinema nacional, porque enche as salas, movimenta dinheiro e, claro, faz com que os nossos talentos sejam revelados e rompam os limites de uma produção televisiva. Mas há o lado ruim. Em Assalto ao Banco Central, de Marcos Paulo, por exemplo, esse lado ruim é o tom novelístico das atuações e dos diálogos. Não à toa, um dos personagens é interpretado por Eriberto Leão, galã da novela das nove.

A trama conta a história do assalto à sede do Banco Central de Fortaleza, em 2006, quando 164 milhões de reais foram roubados sem que fosse disparado um único tiro. Foi o maior assalto da história do país e o segundo maior do mundo. O filme começa meio 11 Homens e um Segredo, com a quadrilha sendo formada em meio a piadas e trocadilhos dando a entender que o roteiro seria linear. Já acostumadas com a linha narrativa, as duas moças que estavam ao meu lado perguntaram (em voz alta) se não seria mostrado o roubo em si quando o delegado Amorim (Lima Duarte) aparece dentro do cofre acompanhado da delegada Telma (Giulia Gam) já investigando a cena do crime. A partir de então a história é contada de duas pontas diferentes, intercalando as cenas da preparação do bando liderado por Barão (Milhem Cortaz) e dos depoimentos dados à Polícia Federal.

Muitas paisagens cearenses são mostradas durante o filme, como a Catedral Metropolitana de Fortaleza, o parque eólico de Aquiraz e o prédio do Banco Central do assalto em questão. Além das paisagens, alguns regionalismos foram inseridos na fala dos personagens, mas alguns soaram tão falsos que as cenas teriam ficado melhores sem eles, com exceção de Gero Camilo e Fábio Lago. A ação é bem desenvolvida e empolga, principalmente porque a trilha, de André Moraes, que acompanha as cenas é extremamente apropriada.

No fim, não se pode dizer que é um filme ruim, mas seus defeitos são bem marcantes, embora eu não ache que as pessoas na sala em que eu estava tenham se importado com isso, principalmente as duas moças ao meu lado, que aparentemente estavam preocupadas só com a fidelidade do roteiro à história real, o que fez com que elas chiassem quando Carla (Hermila Guedes) apareceu: “Essa mulher, inventaram, é só pra ter romance”.

Filipe Teixeira