segunda-feira, 18 de abril de 2011

Inverno da Alma

Nas primeiras cenas de Inverno da Alma, de Debra Granik, percebemos que os cenários estão sempre desarrumados. Cozinhas, salas, jardins, quintais, tudo está em desordem, assim como a vida de Ree Dolly (Jennifer Lawrence), que, aos 17 anos, tem que cuidar dos dois irmãos mais novos e também de sua mãe, que apresenta problemas mentais. Seu pai, ao sair da prisão, não voltou para casa e, como garantia de sua condicional, pôs a casa onde Ree, os irmãos e a mãe moram. A garota, então, precisa, em uma semana, antes da audiência, encontrar o pai, vivo ou morto, para que não “vivam na floresta feito cães”, usando as palavras dela.

A oportunidade e a democracia, símbolos da América, parecem não ter chegado à região onde Ree vive, as montanhas Ozarks, no estado do Missouri (EUA). Ali as relações baseiam-se na vontade dos mais fortes, e ela não faz parte desse grupo. Mas com coragem reúne forças para lutar contra o sistema cru estabelecido e inicia a busca pelo pai, enfrentando humilhações tanto físicas quanto psicológicas.

A fotografia, de Michael McDonough, apresenta um cenário frio, intensificado pelos semblantes dos personagens, sempre fechados, como se a frieza física tivesse congelado suas emoções. Mesmo quando demonstram solidariedade ou quando festejam algo, percebemos que há uma atmosfera de medo, gerando um suspense que agrava o frio do lugar, resultado das ótimas atuações, principalmente de Jennifer Lawrence, John Hawkes (ambos indicados ao Oscar 2011, nas categorias Melhor Atriz e Melhor Ator Coadjuvante, respectivamente) e de Dale Dickey, que está assustadora.

Em determinado momento do filme, Ree pede à mãe um conselho, mas não obtém resposta, devido à sua debilitada saúde mental. Então a protagonista chora, demonstrando sua humanidade, fugindo do estereótipo da heroína tradicional que suporta todas as dificuldades sem apresentar fraquezas. Ela sequer tem esperança, pois, ao ensinar a Sonny, seu irmão, como dissecar um esquilo, ele pergunta, no momento em que tira suas vísceras: “Precisamos comer isso também?” E Ree responde: “Ainda não”. Mas o que se sobressai da personalidade da protagonista é a força e a altivez, representada por um conselho que ela dá a seu irmão: “Nunca peça o que deve ser oferecido”.

Todas essas características levaram este filme a indicações em várias categorias dos principais festivais do cinema independente, como o Sundance Festival e o Independent Spirit Awards,  bem como da maior premiação do cinema americano, o Oscar, com destaque para Jennifer Lawrence, cuja atuação lhe rendeu diversos prêmios. Mas o grande trunfo de Inverno da Alma, assim como em Rio Congelado, de Courtney Hunt, é mostrar ao público essa América que está bem longe da que Hollywood nos oferece.

Filipe Teixeira

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