sábado, 28 de maio de 2011

O Último Voo do Flamingo


A descolonização africana e os desdobramentos que esse processo causou, como ditaduras, guerras civis e a deplorável condição humana do continente negro, já foram exaustivamente abordadas pelo cinema americano. Com O Último Voo do Flamingo, de João Ribeiro – adaptado do romance de Mia Couto – temos a oportunidade de conhecer parte dessa história pelo olhar africano.

O enredo se dá em Moçambique pós-guerra civil. Após uma explosão misteriosa que deixa como vestígios um pênis decepado e um capacete da ONU, o major Massimo Risi (Carlo D’Ursi), das Nações Unidas, viaja à vila fictícia de Tizangara para investigar o caso. Lá ele se depara com os costumes locais, que envolvem o misticismo dos antigos e a corrupção dos novos, que querem tomar o poder.

A África, primitiva e esquecida, que é mostrada se assemelha àquela de O Jardineiro Fiel, de Fernando Meireles, Diamante de Sangue, de Edward Zwick, e Hotel Ruanda, de Terry George, para citar alguns exemplos. Mas o olhar sincero de um diretor africano e as interpretações cruas – embora nem sempre convincentes – dos atores locais dão um toque especial à obra. Um exemplo de como o lugar é atrasado é quando, para tomar um banho, o major precisa esperar o dia seguinte para que um moleque vá buscar um balde cheio no rio.

A brasileira Adriana Alves, no papel de Ana Deusqueira, é o ponto de confluência entre os elementos sobrenaturais que permeiam o filme e a dura realidade do lugar, revelada pela prostituição e pela corrupção. Já a personagem Ermelinda (Cândida Bila) é a metáfora do misticismo, que conduz o cético major a aceitar e até a praticar a religiosidade do lugar.

A figura do herói infalível se revela em Massimo, que conduz a trama até a sua resolução, embora a mensagem do final talvez não tenha sido passada da melhor forma, principalmente porque em muitos momentos o tom de comédia destoa da gravidade do tema.

O filme, enfim, vale pelo inusitado, pela novidade, pois não é sempre que temos a oportunidade de ver a África pelo olhar de um diretor africano, baseado em uma obra literária de um escritor africano. Portanto, a despeito das comparações com o livro – que, segundo alguns críticos, está muito além da obra cinematográfica – o filme agrada bastante e merece ser visto.

Filipe Teixeira

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